quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Porque durmo quatro horas ou sobre o sistema de transporte em São Paulo

Algumas pessoas se assustam quando eu digo que durmo quatro horas por dia. Perguntam a razão e eu digo: acordo 5h da manhã, chego em casa depois da faculdade próximo de meia-noite. A pergunta seguinte é sempre: por que acordar 5h da manhã? Pergunta justa, já que entro no trabalho às 9h. E a resposta tem tudo a ver com logística. Explico.

Moro em uma região afastada de São Paulo, na zona leste. Para chegar às 9 horas do outro lado da cidade, preciso sair no máximo 7 horas. Ainda assim, é um problema. O micro-ônibus já vem lotado. No metrô, a situação é ainda pior. Lotado, mas tão lotado, que para conseguir entrar no trem, é preciso esperar 5, 6, 7, 8 trens passarem até chegar sua vez. Isso em um dia sem problemas no metrô - algo que tem acontecido cada vez menos.

Dentro do trem, é possível imaginar o caos. Um absurdo número de pessoas em um mesmo metro quadrado. Falar em descoforto é um eufemismo. Mas, depois de algum tempo, acaba (às vezes levando fones de ouvido que se enroscam quando as pessoas tentam sair desesperadas do trem no meio daquela lotação absurda). Chega a estação e vem outro ônibus. Neste horário, cheio, claro. Cerca de 2 horas depois, lá estamos no trabalho. Eventualmente atrasado.

Para evitar esse caos, acordo um pouco antes, saio um pouco antes, pego ônibus e metrô cheios, mas não estupidamente lotados, e consigo chegar no trabalho em um tempo ao menos meia hora mais rápido - ou seja, em 1h30. Normalmente, mais rápido do que isso: demoro, algumas vezes, pouco mais de 1h. Aí chego cedo no trabalho, tenho tempo de passar na padaria, tomar café, chegar cedo e poder adiantar tarefas pendentes, algo que eu tenha que fazer para a faculdade.

Alguém vai dizer: "Nada vale acordar 5 horas" ou "para dormir mais, eu enfrentaria isso". Eu enfrento essa loucura de atravessar a cidade para trabalhar há nove anos. Sem contar o tempo que enfrentava para estudar, ainda na escola - porque estudava longe de casa e também e usava esses mesmos transportes para chegar lá.

Dormir cedo não é opção porque estudo à noite e muito, muito longe de casa. Claro, estudo por opção minha. E se perguntam porque não estudo mais perto, a resposta é muito simples: só estudo porque é de graça, não tenho como pagar. E consegui passar em uma universidade pública, depois de me formar em uma privada através de um financiamento do governo (que eu pagarei por mais dez anos, mas isso é assunto para outro dia).

Dormir quatro horas, então, é uma opção, em parte. Poderia dormir cinco, se saísse de casa uma hora mais tarde para chegar às 9h no trabalho. Teria que enfrentar esse inferno um pouco pior do que faço hoje. A minha opção foi tentar sofrer um pouco menos.

A maior parte da população de São Paulo vive nas periferias, distante do centro e do trabalho. É um fardo que milhões precisam passar todos os dias. Essa é a situação do transporte da cidade mais populosa do país. Algumas opções podem ser feitas - como acordar um pouco mais cedo, correr menos risco de atraso e pegar o transporte mais vazio. Outras não podem.

Por exemplo, morar perto do trabalho. Pinheiros, Itaim, região da Paulista? Todas caras, com aluguéis que consumiriam 80% do meu salário. Inviável. Desde 2006 estudo essa possibilidade. Mais uma vez, essa é a situação da maioria das pessoas que mora nesta cidade. Claro que todo mundo gostaria de morar perto do trabalho. Quem não gostaria? A questão passa não por querer, mas por poder. Neste caso, ainda não encontrei uma forma de poder. Se um dia puder, sem dúvida farei isso. Enquanto não é uma opção, trabalho com as variáveis que existem. E essas são elas.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Sim, sou do contra

Não acordo de bom humor. Dizem que não se pode começar um texto com não, mas, bom, e daí? Sou do contra. Confesso. Sou mesmo. Várias vezes eu discordo. Sou pré-disposto a discordar. E sim, eu tenho dificuldade de concordar de cara. Várias vezes eu me calo quando não tenho argumentos, porque o silêncio é preciso quando não temos nada inteligente a dizer.

Sou desses chatos que critica quem coloca status "feliz", "muito feliz" e afins. Sim, pego no pé, sou chato, porque acho que quem é feliz vai lá viver isso, não fica falando isso nas redes sociais para pagar de "minha vida é legal, tá vendo?".

Critico quem lê "O Segredo" e digo que é besteira. Porque acho que é mesmo. Apela para a emoção quando, na verdade, o que importa são as ações. Critico pelo mesmo motivo que falo de "Quem mexeu no meu queijo" e "Você S.A.", livros bobos, que sentimentalizam ações práticas. Falo porque sou prático. Sou determinado a fazer algo e não preciso de carga emocional elevada para realizar. E olha que vira e mexe dá errado.

Agora, é fato que o cara que escreveu "O Segredo" é genial por uma percepção que ele teve: as pessoas precisam de apoio emocional o tempo todo. São carentes. A internet veio mostrar que a necessidade de se expor não é só pelo egocentrismo, é pela necessidade de aprovação, de receber apoio, elogios, ajuda, contato, ainda que para falar mal. E, claro, elogios, mesmo que de desconhecidos, mesmo que nem sejam lá tão sinceros.

Corrijo muitas pessoas que escrevem errado. Amigos, inclusive (alguns diriam que principalmente). Corrijo porque me incomoda e porque não me custa nada. Se são amigos, é parte da obrigação de amigo avisar. Se não é, aviso apenas porque me irrita mesmo.

Sim, eu confesso. Sou do contra.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Aniversário laborioso

Quando as pessoas pensam em aniversários, a imagem é de festa, comemoração, amigos, família, bebidas. E se o seu aniversário não tivesse nada disso? E se no seu aniversário, você chegasse às 7h15 no trabalho e só saísse às 22h? E se, durante o dia, enquanto as pessoas ligam para falar com você, você mal tenha tempo de conversar direito? E se mesmo assim, o dia tenha sido incrível e você tenha voltado para casa sorrindo?

58 milhões de euros. Quarta maior transferência do futebol
Se você não sabe o que é isso, acha que é inimaginável, talvez ainda não tenha vivido a experiência de ter como trabalho uma de suas maiores paixões. Trabalhar para levar às pessoas aquilo que você adora ver, assistir, conversar, comentar. Não tenha vivido a emoção de um trabalho que te faz pulsar de emoção, de ansiedade e fazer o coração bater na garganta, daquele jeito que só quando estamos ansiosos pelos melhores momentos da vida acontece.

Dia de fechamento do mercado de transferências na Europa. Por lá, o chamado mercado de inverno dura de 1 a 31 de janeiro. Coincidentemente, 31 de janeiro é o meu aniversário. O período normalente não tem grandes transferências, já que estamos no meio da temporada europeia, que vai de agosto a maio. Neste 31 de janeiro de 2011 foi diferente.

Especulações movimentaram todo o dia, como é tradicional. Algumas transferências, porém, eram esperadas para sacudir o mercado. Virar tudo do avesso, bater recordes. E no meio da temporada. O dia passava, dezenas de transferências se concretizavam, enquanto as especulações sobre outras aumentavam, esquentavam, deixavam torcedores ansiosos pelo fim de novelas que estavam todas ligadas.

Se Fernando Torres saísse do Liverpool para o Chelsea, o Liverpool tiraria Andy Carroll do Newcastle. Valores astronômicos, quase inacreditáveis. Acompanhamos, minuto a minuto, segundo a segundo. Leitores ansiavam por uma notícia quente, recém saída do forno. Nós ficávamos de olhos, esperando uma definição.

A poucos minutos do final, tudo se concretizou. Transferências milionárias, valores recordes, torcedores com emoções à flor da pele. Um pouco de raiva, um pouco de satisfação, muito de paixão pelo esporte que é uma loucura. Uma loucura que vivemos todos os dias. Cada vez mais apaixonados por ela. Enropercidos por essa loucura e essa paixão. Futebol. Aquele que é, também, o meu trabalho.

Não por acaso, deixamos a redação quase 22h, no dia do meu aniversário, e ainda saí com sorrisos. Foi um dia cheio, trabalhoso, cansativo, mas principalmente, prazeroso. Porque, afinal, era a obrigação profissional, mas era também a paixão.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Esquadrão de malas

Começou o Big Brother Brasil, o famoso BBB. Torna-se rapidamente o assunto de conversas no café, no ônibus, nas redes sociais, até nas conversas de bar. É normal que seja assim. É um assunto forte, popular, no melhor sentido da palavra, porque muita gente assiste e gera repercussão, polêmica.

Não sou muito de assistir BBB. O primeiro acompanhei todos os dias, junto com meu pai. Depois, perdi um pouco o interesse e ficava de olho mais nas gostosas que habitavam a casa. Nesse ano, vi o primeiro dia do programa, enquanto estava de férias do trabalho, e passei a acompanhar um pouco mais.

Uma das imbecilidades que passei a escutar sobre o BBB, e que são recorrentes a cada ano que passa, é a ideia babaca que BBB é coisa de gente, digamos, menos favorecidas intelectualmente. Até chegaram a criar uma campanha no Twitter #troqueobbbporumlivro. Estúpido e explico por quê.

Primeiro, uma campanha como essa parte da premissa que BBB é coisa "popularesca", tal qual novela, futebol e samba. Popular no sentido pejorativo, claro, quando ninguém diz, mas deixa a entender que é coisa de gente pobre, ignorante e afins. Mais ou menos a mesma associação que se faz a quem vota no Lula (ou, na última eleição, na Dilma). Uma premissa, obviamente, falsa.

Outra premissa é que o símbolo de intelectualização é o livro. O livro é uma mídia como outra qualquer. Ler livros, qualquer livro, não torna ninguém mais inteligente que outro. E aí volto à campanha #troquebbbporumlivro. Cliquei na hashtag para ver o que diziam. Uma das sugestões que vi foi "A Cabana". outra foi "Qualquer um da Zíbia Gasparetto". Só faltou alguém citar "O Segredo". Mas certamente algum babaca o fez e eu que não tive paciência de procurar. Acho que já deu para entender o meu ponto, né?

Se não, serei mais claro: pessoas que querem se dizer intelectuais criticam o BBB, como se fosse um programa que só conquistasse gente burra, e sugerem que um livro seria melhor. E aí sugerem "A Cabana" ou Zíbia Gasparetto. Justamente o tipo de livro que é criticado por ser, digamos, coisa de gente menos intelectualizada. Curioso, não?

Mais uma premissa falsa da estúpida campanha #troquebbbporumlivro é que só dá para fazer uma coisa ou outra. Pessoas que lêem livros não podem gostar de assistir ao BBB? E quem disse que quem não vê o BBB lê mais livros? É possível fazer ambos. E é possível também não fazer nenhum dos dois.

Ler e ver BBB não são atitudes correlatas e a sugestão de troca de um por outro sugere várias imbecilidades, que só mostram o quanto as pessoas são babacas. As redes sociais, entre os muitos benefícios que nos trouxe, expõem também cada vez mais a capacidade de babaquice das pessoas. Está aí o perfil do @oclebermachado que não me deixa mentir.

Trabalho com futebol. Cansei de ouvir que é o Pão e Circo moderno, alienante e outras bobagens. Que cultura mesmo é teatro, "boa música" (muitas aspas nisso aí). Zzzzzzzzzz. Soa como a corte do século XVIII falando. Futebol é tão cultura quanto qualquer peça de teatro. Samba é tão cultura (ou mais) do que qualquer tipo de música. E olha que nem sou o maior apreciador do estilo.

É o esquadrão de malas, sempre pronto a disparar babaquices...

PS: quem gosta de BBB e principalmente quem gosta de bom humor, sugiro fortemente acessar o Carolina, minha filha, da excelente @carolinamendes. Risadas garantidas.